Vício em smartphone é tema de trabalho em universidade para rastrear dependência provocada pelo uso do aparelho

09/06/2017

matéria  de Mariana Pires (jornalista da Faculdade de Medicina da UFMG)

Equipe da Faculdade de Medicina desenvolve instrumento para rastrear dependência provocada pelo uso do aparelho

Irritabilidade, inquietude e incômodos provocados pela falta de acesso ao smartphone podem ser sintomas de abstinência, um dos principais sinais de alerta para reconhecimento da dependência do aparelho, doença psiquiátrica cada vez mais frequente entre usuários, que, em casos mais graves, causa transtornos como depressão e ideias suicidas.

Para rastrear essa dependência, um grupo de professores, profissionais e estudantes de medicina e psicologia do Centro Regional de Referência em Drogas (CRR) da UFMG desenvolveu um instrumento inédito no Brasil, o Smartphone Addiction Inventory (SPAI-BR). Trata-se de um questionário com 26 tópicos, que será disponibilizado em breve.

Segundo uma das autoras do estudo, a professora Julia Khoury, do Departamento de Saúde Mental da Faculdade de Medicina, o questionário já existia em outros países e foi adaptado para o Brasil. "O instrumento era mais extenso e tinha um formato diferente", afirma Julia, doutoranda do Programa de Pós-graduação em Medicina Molecular sob a orientação do professor Frederico Garcia. A pesquisa que resultou no SPAI-BR foi desenvolvida de 2014 a 2016. No último dia 17, os resultados do estudo foram publicados em artigo na revista PloS One, especializada nas áreas de ciências e medicina, e disponível para leitura no endereço.

Julia Khoury esclarece que o questionário é um instrumento de rastreamento e não de diagnóstico. "Sete ou mais respostas positivas indicam um risco maior do desenvolvimento da dependência", alerta a médica. Para ela, a partir desse resultado, a pessoa já deve procurar orientação médica. "Só o profissional pode diagnosticar o vício com precisão", afirma.

Para a professora, o desenvolvimento do SPAI-BR possibilita a abertura de novas frentes de pesquisa na área. "Nos próximos meses, avaliaremos cerca de 300 pessoas, também alunos de graduação da UFMG, para compreender as características de personalidade e os parâmetros fisiológicos que possibilitam caracterizar melhor as pessoas mais propensas a desenvolver a dependência de smartphone", conta.

Aplicação do questionário

Durante o desenvolvimento da pesquisa, o questionário foi aplicado em 415 alunos de variados cursos de graduação da UFMG. De acordo com Khoury, o resultado indicou 43% de prevalência de rastreamento positivo, ou seja, em risco de dependência. Desse grupo, 33% tiveram a dependência diagnosticada posteriormente.

Das pessoas que tiveram detectada a dependência de smartphones, 94,9% são solteiras. A maioria, 56%, tem renda familiar mensal superior a três salários mínimos. A dependência é mais prevalente em mulheres, com 55% do total de alunos avaliados.

A pesquisadora conta ainda que a dependência de smartphone entre os alunos da UFMG foi associada à dependência de Facebook, abuso de álcool, depressão maior, fobia social, transtorno de ansiedade generalizada, baixa satisfação com suporte social, alta impulsividade e traço de personalidade de elevada busca de sensações.

Sintomas e tratamento

Segundo Julia Khoury, as doenças psiquiátricas podem ter vários sintomas. "O transtorno ocorre quando começa a ser prejudicial no dia a dia. É preciso ficar atento a alguns sinais, como a ansiedade demonstrada por uma pessoa quando fica longe do aparelho e deixa de fazer outras atividades no âmbito do trabalho ou do lazer", exemplifica. Ela afirma que o transtorno é mais comum em adolescentes e estudantes universitários e pode comprometer o sono, a capacidade de concentração e a aprendizagem.

De acordo com a pesquisadora, a relação da dependência de smartphones com o vício em drogas carece de mais investigação. "Os sintomas são muito semelhantes, mas há necessidade de mais estudos para determinar um possível tratamento", explica. Algumas terapias podem ser utilizadas para tratar os sintomas do vício. "Existem remédios, por exemplo, para ansiedade e depressão", observa a pesquisadora. Ela conta que esses sinais podem ser, inclusive, a causa do vício. "Ao identificar e tratar essas doenças, as chances de tratamento da dependência são potencializadas", afirma.

O Ambulatório de Dependências Químicas e Comportamentais do Hospital das Clínicas da UFMG atende pacientes com dependências sem necessidade de encaminhamento do posto de saúde. Os atendimentos ocorrem às segundas-feiras, das 8h às 12h, e podem ser marcados no local. O Ambulatório fica no 6º andar do Hospital Bias Fortes, na Alameda Álvaro Maciel, 175, bairro Santa Efigênia.

Faça o teste abaixo e lembre-se: se responder "sim" a pelo menos sete questões, você pode ser um dependente do celular:

1-    Já me disseram mais de uma vez que passo tempo demais no celular.
2-    Sinto-me inquieto quando fico sem usar o smartphone durante certo período de tempo
3-    Acho que tenho ficado cada vez mais tempo conectado ao celular
4-    Fico inquieto e irritado quando não tenho acesso ao smartphone
5-    Tenho disposição para usar o celular mesmo quando estou cansado
6-    Uso o smartphone durante mais tempo e/ou gasto mais dinheiro nele do que pretendia inicialmente
7-    Embora o uso do celular tenha trazido efeitos negativos aos meus relacionamentos interpessoais, a quantidade de tempo que gasto nele mantém-se a mesma
8-    Em mais de uma ocasião, dormi menos de quatro horas porque fiquei usando o smartphone
9-    Venho aumentando consideravelmente o tempo gasto com celular nos últimos três meses
10-    O uso de celular tem causado efeitos negativos no meu desempenho na escola ou no trabalho
11-    Sinto falta de algo ao parar o uso do smartphone por um certo período de tempo
12-    Minha interação com meus familiares diminuiu por causa do uso do celular
13-    Minhas atividades de lazer diminuíram por causa da utilização do smartphone
14-    Sinto uma grande vontade de voltar ao smartphone logo depois que parei de usá-lo
15-    Minha vida seria sem graça se eu não tivesse celular
16-    Navegar no smartphone tem causado prejuízos à minha saúde física; por exemplo, uso o celular quando atravesso a rua, enquanto dirijo ou espero algo, e esse uso pode me colocar em perigo
17-    Tenho tentado passar menos tempo usando o smartphone, mas não tenho conseguido
18-    Tornei o uso do celular um hábito e minha quantidade e tempo total de sono diminuíram
19-    Sinto-me incomodado ou para baixo quando paro de usar o smartphone por certo período de tempo
20-    Não consigo controlar o impulso de fazer uso do celular
21-    Fico mais satisfeito utilizando o smartphone do que passando tempo com meus amigos
22-    Tenho dores e incômodos nas costas ou desconforto nos olhos devido ao uso excessivo de celular
23-    A ideia de usar o smartphone vem como primeiro pensamento na minha cabeça quando acordo de manhã
24-    Preciso gastar cada vez mais tempo no smartphone para alcançar a mesma satisfação de antes
25-    Não consigo fazer nenhuma refeição sem usar o celular
26-    Sinto-me cansado durante o dia devido ao uso do smartphone tarde da noite/madrugada

ASSESSORIA DE COMUNICACAO SOCIAL