18º P&E |No Polo BH, palestra questiona uso e significado atuais da palavra periferia
— Quando você ouve falar na palavra periferia, o que primeiro vem à sua cabeça?, inquiriu o professor Heli Sabino de Oliveira, da UFMG, ao público presente, para ser torpedeado com expressões, como "medo", "violência", "tráfico", "armas", entre outras de igual valor semântico depreciativo.
E quem primeiro apontou as expressões não foi a elite intelectual que acede à Academia, foram as próprias crianças e adolescentes atendidos pelo Programa Fica Vivo, do Governo de Minas, que promove oficinas culturais e esportivas em comunidades da capital mineira com altos índices de criminalidade e óbitos entre pessoas dessas faixas etárias.
Os jovens, que antes da palestra haviam feito uma apresentação de percussão no saguão da Escola de Design, são oriundos do Bairro Ribeiro de Abreu e, alguns deles, segundo o educador Sérgio Magalhães, monitor do projeto na região, com histórico de delitos e envolvimento com o tráfico de drogas da região. "Trabalhamos em duas frentes: a primeira na recuperação de jovens com envolvimento com a prática de delitos e em outra para evitar que esse jovem siga também esse caminho", afirma.
O professor Heli Sabino de Oliveira, da UFMG, afirmou que os termos depreciativos a respeito da palavra periferia são construídos socialmente, em relações midiáticas e de poder, já que etimologicamente signifcam apenas locais que não estejam em posição geográfica central. "Assim, até mesmo a famosa região da Savassi deveria ser nomeada como periferia", ironizou. Dedicou bastante tempo de sua fala ao papel da mídia na construção do ideário que as classes dominantes têm de periferia: citou exemplos de manchetes, principalmente em jornais populares de circulação na capital, que trabalham suas capas diárias sobre o tripé da mulher como objeto de desejo, futebol e crimes sangrentos, sendo nestes onde geralmente se destacam as periferias.
Tanto Oliveira quanto Magalhães defedem que o poder público falha reiteradamente em oferecer os mesmos serviços disponíveis para a região central. Abandonadas à própria sorte, as comunidades geralmente criam as próprias regras e códigos e deles surgem hierarquias, à parte daquelas constituídas pelas leis e em cujos contextos e consequências não se reconhecem.
Nesse contexto de falta de investimentos na periferia, os professores se mostraram favoráveis às manifestações que ocorrem sobretudo entre os estudantes secundaristas e universitários, que protestam contra os ajustes pedagógicos e orçamentários que se encontram atualmente em votação no Congresso Federal, especialmente a Proposta de Emenda à Constituição nº 55 (antiga PEC 144), que, em linhas gerais, pretende manter os níveis atuais de investimentos governamentais em áreas como a Saúde e Educação, atualizados apenas com correções inflacionárias.
Expressaram toda sua solidariedade aos movimentos de ocupação de escolas e espaços públicos, entendendo que as manifestações representam uma parcela da sociedade exigindo que sua voz seja ouvida e considerada. As falas convergem com as do vice-reitor da UEMG José Eustáquio de Brito, que,
frente a um panorama de congelamento de investimentos em educação e cortes em bolsas de iniciação científica e pós-graduação, considerou a própria realização do Seminário de Pesquisa e Extensão como um "ato de resistência".